Fases de um assédio moral
A história do golpe também pode ser contada a través do seguinte texto generico sobre as fases de um assédio moral que descreve de maneira assustadoramente precisa o que aconteceu com a gente.
Agosto 2014 - Outubro 2015
1. Fase de sedução
Nesta fase o instigador do assédio estuda e avalia as qualidades das pessoas alvo e localiza seus pontos fracos, tenta descobrir até onde sua influência e poder podem ir, e até que ponto poderá subjugá-los para atingir seu objetivo.
Novembro de 2015
2. Fase de iniciação de conflito
Surge um conflito que pode ser real ou criado artificialmente. O relacionamento interpessoal, seja bom ou neutro, passa então por uma mudança negativa de maneira brusca. O conflito não é resolvido e o assédio começa. Às vezes, o tempo entre "conflito" e "assédio" é tão curto que os dois se sobrepõem. Diante das pressões iniciais do assédio psicológico, o primeiro sintoma das vítimas é a desorientação.
Novembro de 2015
3. Fase de inicio do assédio
No inicio deste estágio, o assediador continua testando as águas, faz tentativas de agressão moderada e depois recua.
Num certo momento, inicia-se a desestabilização dos alvos com a tática do silêncio (Stonewalling). Essa fase costuma se prolongar no tempo devido às atitudes de negação da realidade por parte das próprias vítimas, que se sentem desorientadas e não acreditam no que lhes está acontecendo.
Mentiras, humilhações e desprezos ocorrem repetidamente diante dos quais as vítimas esperam por um pedido de desculpas que nunca ocorre. Elas não sabem que estão sendo forçadas porque a guerra ainda não foi declarada. Elas acham que há um problema de comunicação que será resolvido conversando. Mas o assediador não fala, não explica, e enquanto a vítima está ocupada tentando entender o que está acontecendo, ela não percebe que, na verdade, não existe nada a entender além da existência de uma guerra soterrada e unilateral. Mas o assediador irá manipular o sentimento de culpa para bloquear as vítimas psiquicamente, causando grande angústia.
Numa tentativa de parar a pressão, as pessoas alvo tentam uma e outra vez establecer o dialogo e esperam que o “conflito” acabe sem chamar a atenção . Não querem fazer parte de um pulso ou julgamento público contra o assediador.
É frequente que nesta fase 3 o assediador esteja, paralelamente, na fase 1 de seduzão com algumas pessoas do entorno das vitimas que ele detectou como possíveis colaboradores. Ao mesmo tempo, sempre que tem oportunidade, fala mal das vitimas a todo mundo: atribui-lhes erros, espalha calúnias e difamações; faz circular rumores falsos e verdadeiros sobre suas vidas e comportamentos. Vai assim preparando o ambiente propicio.
Janeiro de 2016
4. Fase de consolidação do assédio
Nesta fase as vítimas costumam estar sujeitas ao dilema de ou ceder às pretensões seguramente inadmissíveis do assediador ou ter que enfrentar assédio de maior intensidade e persistência.
Se perguntam onde eles erraram e o que elas deveriam fazer para que o assédio cesse. Começam a refletir sobre os próprios erros e repetidamente insistem em sua análise, se colocando em um ‘impasse’ psiquico.
Buscam repetidamente uma forma de solucionar o problema que não prejudique seus interesses na organização ou seus trabalhos, suas vidas,.... Enquanto isso, tendem a recorrer aos seus relacionamentos mais próximos, aguardando a ajuda necessária e encontrando -normalmente- uma incompreensão do problema ou falta de contribuição na direção da resolução do mesmo.
Perante as agressões as pessoas assediadas podem decidir não fazer nada com a esperança de conseguir resolver a situação em pouco tempo e da forma mais discreta possível.
"... as vítimas temem fazer denúncias formais, com medo do “revide” que poderia ser a demissão ou o rebaixamento de cargo, por exemplo; além de que essas denúncias iriam tornar pública a humilhação pela qual passaram, o que as deixaria ainda mais constrangidas e envergonhadas. Assim, o medo (de caráter mais objetivo) e a vergonha (mais subjetiva, mas com conseqüências devastadoras) se unem, acobertando a covardia dos ataques". (Roberto Heloani, 2005)
As vítimas podem reagir o que costuma levar ao confronto aberto com o assediador e com o risco implícito de que o conflito se espalhe para o resto da organizaçõ e/ou da opinião pública.
Esta será a primeira teia de aranha em que será apanhada a pessoa ou grupo assediado, e este será um dos momentos cruciais para acabar com o assédio sem causar ainda danos de difícil reparação.
Mas, se o alvo decidir agir de forma submissa diante do assédio subterrâneo, ele se prolongará no tempo.
“ (...) ao não modificar as condições que permitiram sua aparição, a violência continua. Nesses casos as vítimas costumam tentar manter a relação com o agressor podendo assim, produzir uma espécie de aliança tácita. (...) As vítimas, num movimento altruísta ilusório, se resignam a se submeter aos abusos e, ao mesmo tempo que reclamam das atitudes negativas do agressor, seguem idealizando seus aspectos positivos”. (Hirigoyen,1998).
Quando se aceita a submissão, a relação instala-se nessa modalidade de forma definitiva: as vítimas se encontram cada vez mais apagadas e deprimidas e o agressor cada vez mais dominante e confiante no seu poder. São vítimas de uma injustiça, mas a confusão é tão grande que não conseguem reagir.” (Hirigoyen, 1998).
Quando o entorno não é capaz de reagir e apoiar as vítimas, parece não haver solução possível se não a submissão. A submissão é o mecanismo de supervivência que evitará as consequências de enfrentar o instigador e colaboradores do assédio.
"Quando a submissão é aceita, a violência -mesmo que soterrada - continuará e estabelecerá um processo de dominação em que as vítimas vão perdendo gradativamente sua resistência e tendo cada vez menos chances de se opor a ela. (Hirigoyen, 1998)".
“Assim, quando elas se tornam incapazes de reagir e se abatem, as vítimas se tornam cúmplices do que as oprime. Sem nunca haver consentimento de sua parte, mas sim uma coisificação, elas se tornaram incapazes de ter seu próprio pensamento e só podem pensar como seu agressor”.
Fevereiro 2016
5. Fase de poluição do entorno
Às vezes, o conflito transcende o grupo e contamina a comunidade e é frequente que esta veja as vítimas como o problema a ser combatido e se junte ao instigador do assédio. Quando as redes sociais são utilizadas para aumentar a pressão e o descrédito, os efeitos destrutivos também aumentam.
“Para justificar o descrédito público da vítima, previamente, o instigador deve inventar um subterfúgio que choca o público e o confunde através de um escândalo para posteriormente obter o apoio do cidadão para a campanha pública de descrédito e humilhação e assim deixar a vítima sem apoio”. (Marina Parés Soliva, “O assédio na mídia”).
Ao encontrar um público seduzido, colaborador e insensível à humilhação sofrida pelas vítimas, a situação se agrava.
Uma vez constituída a quadrilha de assédio e depois de verificada a impunidade de suas ações devido à apatia do meio ambiente em reagir, surge um aumento da pressão de assédio contra as pessoas-alvo.
Segundo Marina Parés Soliva, presidenta do Serviço Europeu de Informação ao Mobbing, "o assédio midiático recorre a dois atos cênicos para ter sucesso: no ato um o assediador prepara a cenografia, uma encenação para punir a vítima e prejudicar sua imagem pública. É um castigo e execução extrajudicial que não dá opção à inocência ou a outra versão que não seja a do instigador do linchamento. No segundo ato, a condenação pública se manifesta confundindo o justo com o justiceiro".
Fevereiro 2016
6. Fase de revelação
As vítimas começam a perceber melhor o que está acontecendo e tentam dar nome aos bois. Mas a irracionalidade da situação e o medo fazem que o espírito crítico seja bloqueado e que haja uma sensação de falta de opções de fuga.
Elas discutem isso com amigues, familiares e colegas. As pessoas duvidam. Não pode ser. Para as pessoas externas ao processo, a violência gratuita parece-lhes inimaginável. As vítimas também duvidam.
Setembro 2016
7. Fase de afrontamento
O alimento do assédio paralizante é o silêncio. “Por isso para reagir é preciso falar, pensar, entender, denunciar, apontar, indignar-se”. (Sousa e Tessler 2004).
Nesta fase as vitimas tentam abandonar sua posição imobilizada. Decidem se comportar como pessoas livres e sair do processo de domínio, mas a reação acostuma a levar a uma intensificação das dinámicas de descrédito e culpabilização.
Quando a vítima se rebela, há uma fase de intensificação do assédio e o assediador assume o papel de vítima. O importante para o assediador é que “seu alvo a bater, pareça responsável pelo que lhe acontece” (Hirigoyen, 1998). O alimento do assédio paralizante é o silêncio. “Por isso para reagir é preciso falar, pensar, entender, denunciar, apontar, indignar-se”. (Sousa e Tessler 2004).
"Na medida em que, por dominação, as vítimas se mostraram muito
conciliatórias, agora tem que mudar de estratégia e agir com firmeza e sem medo do conflito". "A princípio, qualquer mudança de atitude por parte da vítima tenderá a provocar um aumento das agressões e provocações. O instigador tentará culpá-la ainda mais: (...).” (Hirigoyen, 1998)
O grupo assediador tentará por todos os meios impedir que as pessoas alvo se rebelem e farão que elas pareçam responsáveis pelo que lhes acontece. Além do mais, quando as vítimas reagem fazem com que o conflito que estava escondido emerja e se evidencie. Isso pode levar às pessoas a acreditarem que esse é o origem da crise, que a pessoa que reage é a pessoa que faz a agressão.
Mas “é preciso assumir a escolha, porque só assim poderá provocar uma mudança (...) Essa é a única forma possível de solução ou, pelo menos, de melhoria. Quanto mais essa crise demorar, mais violenta ela será”.
Nesta fase onde é necessário resistir psicologicamente, autores como Hirigoyen mencionam a importância de conseguir apoio com pessoas localizadas fora do ambito social onde o processo de assédio ocorre.
“... não confie nos conselhos de amigos, familiares ou pessoas que tentam se colocar na posição de mediadores, pois as relações mais próximas podem não ser neutras. O círculo social também está desorientado e tende a se inclinar para um lado ou para o outro. (...) Algumas pessoas que parecem próximas se deixam manipular, desconfiam ou expressam censuras. Outros, não entendendo a situação, decidem não se intrometer.”
2017 - 2018
8. Fase de destruição
Essa fase ocorre quando o entorno não consegue proteger as vítimas e permite que as dinâmicas de descrédito e culpabilização continuem. Se apesar da falta de apoio no entorno, as vítimas decidem resistir, a pressão aumentará.
"quando as vítimas começam a dar nome aos bois, elas se tornam perigosas para o assediador e devem ser feitas pressões de todas as formas possíveis para silenciá-las".
As vítimas, então, recebem mensagens de pessoas que as responsabilizam pelo problema, acusam de difamação e a fazem acreditar que todos estão contra ela.
Com o tempo, e se o gaslighting de pessoas do entorno persistir, ocorre um processo de introjeção de culpa e isolamento; as vitimas começam a duvidar da própria realidade e acabam perdendo seus mecanismos de afronta, defesa e luta. Quando isso ocorre,a personalidade muda, os comportamentos mudam, perde-se a espontaneidade, cresce a desconfiança. As pessoas ficam irritáveis e agressivas e essa irritabilidade e agressividade será usada para aumentar o descrédito e a (auto) culpabilização num ciclo que vai se retroalimentando cada vez mais.
A saúde física e psicológica se deteriora rapidamente. O transtorno de estresse agudo (TEA) pode aparecer. A tensão geral no corpo leva à fadiga extrema, sensação de desesperança, agitação intensa, uma sensação contínua de alerta e desconcentração.
“Todo o esforço é dirigido a não pensar (...) A falta de concentração é tanta que tem que ler o mesmo parágrafo dez vezes”(Millás, 2004).
Quando o processo se prolonga, o cérebro não aguenta tanta pressão e o hormônio da depressão é ativado funcionando como um mecanismo de sobrevivência. Se não fosse ativado ocorreria uma falha generalizada no organismo. Nesta fase é comum que as vítimas se coloquem em situações de perigo físico, ocorrem acidentes, quedas, etc. Outros tentam ou cometem suicídio.
2017 - 2018
9. Fase de exclusão
Também chamada de fase de marginalização ou abandono e nele é comum que as vítimas sofram de transtorno de evitação. Evitam qualquer tipo de interação social e desaparecem de seu círculo social, trabalho, escola, círculo acadêmico, cidade, etc.
10. Fase final de cronificação ou de recuperação
As vítimas costumam ter sequelas, desde fobias a mudanças
personalidade irreversível, e algumas nunca conseguem reconstruir sua vida emocional e/ou laboral. A gravidade destas sequelas geralmente depende da
duração e intensidade da agressão e do gráu do apoio recebido.
Algumas conseguem se recuperar e resgatar sua vida e sua identidade.
“As vítimas, acima de tudo, elas pedem que tudo o que suportaram seja reconhecido, mesmo que uma injustiça nunca possa ser reparada completamente. Na empresa, o reparo envolve indenização econômica que, em todo caso, não é suficiente para compensar o sofrimento vivido. (...) Se há arrependimento, sempre vem de terceiras pessoas: aquelas que foram testemunhas silenciosas ou aquelas que foram cúmplices da agressão. Somente elas podem expressar seu pesar e, com isso, restaurar sua dignidade (Hirigoyen, 1998).